Se a pandemia levar o mundo a pensar sobre este ritmo insano de vida em que os desejos de consumo e de acúmulo de riquezas geram tanta desigualdade social e transformam bilhões de pessoas em mercadorias à disposição de alguns poucos, para concentrarem fortunas que perduram por gerações, as quais, se distribuídas, elevariam a existência de todos a um patamar justo de dignidade…
Se a pandemia nos convencer de que o que se espera de uma estrutura social dita organizada é que todos os cidadãos sejam tratados como tais, que a função e o sentido do Estado é corresponder às necessidades básicas de toda a população, e não aos interesses das elites que o têm colocado a seu serviço, que urge uma nova ordem política, econômica e social em que a emancipação humana seja o resultado, e não a exploração da vida pelo binômio trabalho – consumo dominado pelo interesse de lucro…
Se a pandemia mostrar que podemos viver de forma mais simples e plena, que a graça e a bênção na vida de todos deve ser reconhecida, desfrutada e preservada a cada dia, que ninguém é mais importante do que ninguém, que as pessoas morrem e não voltam mais, que o individualismo e o egoísmo precisam ser superados, na prática, pela solidariedade…
Se a pandemia nos despertar, de fato, para a atual destruição dos recursos naturais que atinge o ponto de a Ciência alertar que estamos diante de um já quase inevitável cataclisma ambiental, ser reconhecida como apelo ou intervenção da natureza para que a vida humana e a de todas as outras espécies sobrevivam a tudo o que temos feito e nos persuadir de que precisamos mudar radicalmente, talvez ultrapassemos o limite previsível e trágico do capítulo final da História da humanidade.
DAMASCENO, Elenilto Saldanha. Se a pandemia… Jornal VS, São Leopoldo, p. 10, 30 mar. 2021.
