A caracterização do espaço é um dos aspectos do nível descritivo do plano diegético de uma narrativa literária. Roland Barthes, grande crítico literário, escritor, filósofo, semiólogo e sociólogo francês, classifica a caracterização do espaço como função descritiva de “informação”, a qual serve, conforme o crítico literário e professor Salvatore D’Onofrio, para “relacionar o enunciado com a enunciação, enraizar a ficção no real” e produzir efeitos de realidade e de verossimilhança.
De acordo com os estudos apresentados em O discurso e a cidade, importante obra de Antonio Candido de Mello e Souza, professor, sociólogo e um dos expoentes da crítica literária brasileira, os elementos caracterizadores do espaço apresentam funcionalidade na narrativa literária, a qual “pressupõe um tratamento funcional dos espaços”. Antonio Candido confirma que tais elementos relacionados ao topus, denominados de funções integrativas “informantes”, articulam-se na narrativa com a função de criação de efeito de realidade e “para criar a impressão de verdade”.
Na obra de Machado de Assis, elementos referentes ao domínio da Geografia são representados com aspectos de multissignificação literária. Em seus contos e romances, a representação de espaços e ambientes remete a aspectos materiais e físicos, mas também está associada às condições psicológicas das personagens e, conforme Candido, como tênue “reflexo da alma no espaço físico”.
Em Dom Casmurro, o universo fictício retrata o ambiente humano e social e o espaço geográfico do Rio de Janeiro no final do século XIX. Elementos da realidade são transpostos para esse universo diegético e acrescentam-lhe caráter de verossimilhança, processo denominado por Antonio Candido de “redução estrutural, isto é, o processo por cujo intermédio a realidade do mundo e do ser se torna, na narrativa ficcional, componente de uma estrutura literária”.
O código geográfico, em Dom Casmurro, estabelece duas leituras. A leitura geográfica e topográfica de locais do Rio de Janeiro e a leitura geopolítica do contexto mundial da época.
A série de artigos literários aqui iniciada proporá a análise do código geográfico em Dom Casmurro como uma entre as múltiplas leituras possíveis da obra.
Referência bibliográfica:
SOUZA, Antonio Candido de Mello e. O discurso e a cidade. Rio de Janeiro / São Paulo: Ouro sobre Azul / Duas Cidades, 2004.
