O tamanho do poeta

A poesia de Manuel Bandeira, poeta modernista da primeira metade do século XX, tem a subjetividade como traço essencial. De acordo com o crítico literário Domício Proença Filho, é através da subjetividade que o escritor “traz à tona o seu mundo interior, com plena liberdade”. Assim, Bandeira fundamenta seu lirismo como expressão da subjetividade humana e, também, como expressão da liberdade de criação, pois o próprio poeta, em um de seus versos, declara não querer “mais saber do lirismo que não é libertação”.

Muitas vezes, seus poemas retratam aspectos autobiográficos, em uma simbiose entre autor e eu-lírico. Os versos de Manuel Bandeira revelam um universo de lirismo íntimo, o qual o crítico literário e professor Alfredo Bosi define como “lirismo confidencial”. Entretanto, além de forma de autoexpressão, é um lirismo com dimensão universal. Ao priorizar a essência humana, reverbera uma busca coletiva, expressa a espontaneidade de nossos sentimentos e projeta nossas vidas dentro dos poemas.

Na tradição literária que o antecedeu, o lirismo estava, geralmente, associado a elaborações rítmicas e métricas em sintonia com os sentimentos expressados. Mesmo considerado o precursor da prática regular do verso livre, característica marcante da poesia modernista, Manuel Bandeira foi, também, um extraordinário autor nas formas tradicionais e se revelou, entre os poetas modernistas, aquele com melhor conhecimento da métrica da língua portuguesa. Todavia, muito mais que ritmo e métrica, o lirismo na obra de Bandeira retrata a profunda sensibilidade de um poeta maduro a refletir, paralelamente, sobre a existência humana e sobre a história de sua própria vida. De acordo com o crítico literário e professor José Aderaldo Castello, a poesia de Bandeira é construída com “conteúdo autodefinidor, exprimindo um conflito que traduz a persistência de dois estados de espírito”, de resignação e de esperança, e a busca de equilíbrio e harmonia entre eles para encontrar perspectivas de renovação.

O poeta, certa vez, definiu a poesia lírica (ou solitária) como poesia menor, ao compará-la à poesia social (ou solidária), apontada como poesia maior. Bandeira, nesse aspecto, confessou-se um poeta menor, no último verso do poema Testamento: “Sou poeta menor, perdoai!”.

Bosi ressalta que “Fez por certo uma injustiça a si próprio, mas deu, com essa notação crítica, mostras de reconhecer as origens psicológicas da sua arte: aquela atitude intimista (…), pela prática de um lirismo confidencial, autoirônico, (…) fusão de confidência e sábio jogo técnico”.

Essa questão sobre o “tamanho” do poeta é inquestionavelmente definida por outro poeta, José Paulo Paes, ao homenageá-lo em um de seus poemas, Epitáfio, no qual evidencia a verdadeira dimensão da obra e do homem Manuel Bandeira:

“13 de outubro, morte de manuel bandeira

Epitáfio

poeta menormenormenormenormenor

menormenormenormenormenor enorme”

Foto por Tima Miroshnichenko em Pexels.com

Publicado por eleniltosaldanhadamasceno

Sou professor de Língua Portuguesa e de Literatura, jornalista e iniciei, em 2020, minhas atividades como escritor em formação e em ação. Sou mestre em Letras/Estudos de Literatura, especialista em Literatura Brasileira, graduado em Letras e em Jornalismo. Tenho 54 anos, nasci e sempre vivi em São Leopoldo/RS.

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