O pernambucano Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Filho, um dos grandes poetas brasileiros, destacou-se pela sua imaginação criadora, caracterizada pelo crítico literário Domício Proença Filho como “capacidade de criar mundos imaginários e de acreditar na realidade dos mesmos”. Em um de seus principais poemas, Vou-me embora pra Pasárgada, Manuel Bandeira cria um reino imaginário a partir de referências autobiográficas e ao passado histórico. Conforme o linguista e tradutor Giovanni Pontiero, “Pasárgada era o nome de uma cidade fundada por Ciro, o Grande, um retiro de verão nas montanhas na Pérsia Meridional. A beleza sonora desta palavra acompanhou Bandeira por vários anos; para o poeta, ela evocava a imagem de uma terra de prazeres ilimitados e uma fuga acolhedora das ásperas realidades do cotidiano”.
Pasárgada é idealizada como paraíso, terra de deleites e felicidade. O poema também retrata uma construção identitária nacional, um modo de ser e de se sentir brasileiro que, segundo Proença Filho, traduz “muito da nossa individualidade e da nossa dimensão coletiva” voltadas à saciedade de necessidades cotidianas e desejos de prazer, aventura e liberdade.
Desde jovem, Manuel Bandeira teve sonhos e vida limitados pela tuberculose, cujo tratamento exigia uma série de cuidados. Em Vou-me embora pra Pasárgada, há uma simbiose entre um eu-lírico a desejar vida em plenitude e o autor a reviver afetos e experiências de sua infância: fazer ginástica, andar de bicicleta, montar em burro brabo, subir no pau-de-sebo, tomar banho de mar, deitar na beira do rio, ouvir “as histórias que no tempo de menino Rosa vinha me contar”. É o lirismo de Bandeira, fruto da imaginação criadora que inspira toda criança a ser um pouco poeta e todo poeta a ser um pouco criança.
DAMASCENO, Elenilto Saldanha. “Bora” pra Pasárgada. Jornal VS, São Leopoldo, p. 10, 9 maio 2022.
* Em Fernando de Noronha, minha Pasárgada.
